Porto Feliz 1819
"É muito menos extensa do que Itu e não tão bem construída: sua localização, porém, é infinitamente mais aprazível. Efetivamente, estende-se por uma colina, a cujo sopé corre o Tiete. De vários pontos vê-se este rio, que serpenteia por um profundo vale, estando situadas em margens várias fazendas; mas ao longe vêm-se extensas terras cobertas de matas e de pastagens. A colina sobre a qual a cidade foi construída eleva-se quase a pique acima do Tietê; contudo, em espaço considerável, estende-se muito suave, até a margem do rio; nesse ponto, denominado porto, efetua-se os embarques pela via fluvial. O terreno em que foi edificada Porto Feliz é muito acidentado. As ruas da cidade não são calçadas, nem mesmo foram niveladas. As casas, baixas, pequenas, afastadas umas das outras, só tem, em geral, o rés do chão; ao passo que as de Itu são, em sua maioria, construídas de taipa, em Porto Feliz são todas construídas com ripas cruzadas ( pau a pique ) e terra tapando os interstícios, e isso porque na cidade e seus arredores não é encontrada a argila própria para fazer a taipa. Há em Porto Feliz apenas um edifício religioso, que é a igreja paroquial, sendo a única construção feita como as casas de Itu. Na época de minha viagem, essa igreja, consagrada a Nossa Senhora Mãe dos Homens, não estava ainda inteiramente terminada. Mede cerca de 58 passos de comprimentos, a contar da capela-mor até a porta de entrada; tem duas torres, que servem de campanário, construídas, segundo o costume do país, dos dois lados da porta central de entrada.
O Tietê atualmente, só contribui para embelezamento de Porto Feliz; mas, com o correr dos tempos, dará a esta cidade a mais alta importância. Com efeito, além do Salto de Itu, torna-se ele navegável um pouco abaixo da mesma, e em Porto Feliz terão início as gigantescas navegações, a que já me referi noutro lugar, e que ferem de espanto a imaginação dos europeus, acostumados a seus rios mesquinhos...
Já a maior parte das casas de Porto Feliz pertence a agricultores, e nessa localidade só vi um pequeno número de lojas e vendas. Constitui a riqueza da região a cultura da cana-de-açúcar. Os habitantes de Porto Feliz dizem ser suas terras, que tem cor vermelha, muito mais adequada a cultura da cana do que as terras de Itu; acrescentam que com o auxílio de dez escravos podem produzir mil arrobas de açúcar e mais até; enfim, que não é necessário, depois de arrancada à cana, deixar repousar o terreno por mais de dois a quatro anos. Mas, de outra parte, Porto Feliz está mais longe de Santos do que Itu, gastando-se mais de oito dias para a viagem a Santos; na época de minha passagem por ali, época em que o milho era raro e extremamente caro, os arrieiros exigiam, para o transporte de uma arroba (14, 7 quilos) uma pataca e meia (3 francos.), importância que, convém não esquecer, tinha valor muito mais elevado do que atualmente.
(*) Auguste de Saint-Hilaire - Viagem A Província de São Paulo (São Paulo, Livraria Martins Editora - Editora da Universidade de São Paulo, 1.972).
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