sexta-feira, 3 de junho de 2016
Nossa Senhora da Penha –
Nossa Senhora Mãe dos Homens (*)
Vejamos agora o motivo da mudança da invocação de sua padroeira, de
Nossa Senhora da Penha para Nossa Senhora Mãe dos Homens. Velhos
portofelicenses, procurando explicar o motivo dessa mudança, contaram o
seguinte, que ainda é corrente em Porto Feliz: A imagem de Nossa Senhora Mãe
dos Homens foi mandada vir para servir de padroeira a povoação de Cuiabá, e que
chegada a Araritaguaba, permaneceu por algum tempo ai a espera da monção, e
que, chegada esta, ao tentarem erguer a imagem da Senhora Mãe dos Homens para
levarem-na ao batelão que devia conduzi la a Cuiabá, se tornou tão pesada que
não foi possível levantá la do solo, por mais esforços empregados; viram os
presentes nesse fato o desejo manifesto de Nossa Senhora Mãe dos Homens de que essa imagem ficasse em Araritaguaba e
servisse de padroeira dessa povoação. Até ai a lenda. Vejamos agora o que nos
diz a historia.
Em primeiro lugar, devemos declarar que o padroeiro de Cuiabá sempre foi
o Senhor Bom Jesus e não Nossa Senhora Mãe dos Homens. Percorrendo a relação
dos padroeiros das primitivas povoações de Mato Grosso não encontramos povoação
alguma que tivesse como padroeira Nossa Senhora Mãe dos Homens. Segundo consta
do Livro I do Tombo da paróquia do Porto Feliz, essa “imagem majestosa e
perfeita” foi mandada vir especialmente para ser colocada em “sua sumptuosa
Igreja” que os moradores de Araritaguaba “a sua custa e com esmolas dos fieis”
estavam construindo em louvor a Nossa Senhora Mãe dos Homens.
Pelo exposto vemos que, sendo pequena e talvez estando em ruínas à
primitiva capela de Nossa Senhora da Penha, e tendo sido construída uma grande
igreja em louvor a Nossa Senhora Mãe dos Homens, passou esta igreja a servir de
matriz, passando então o seu orago a ser a padroeira da paróquia. Toda lenda
tem a sua origem em um fato qualquer que lhe de motivo; assim cremos que a
lenda referente à imagem de Nossa Senhora Mãe dos Homens teve a sua origem no
fato que passamos a relatar.
Segundo nos conta Joaquim da Costa Siqueira em sua “Crônica de Cuyabá”,
a 8 de janeiro de 1776 chegava a Cuiabá, onde ia exercer o cargo de juiz de
fora, o Dr. Jose Carlos Pereira, o qual, além de ser uma autoridade diligente e
austera, era muito piedoso. Em 1779, em uma diligencia que fez a missão de
Santana, teve ocasião de ver “a palhoça na verdade indecentissima em que se
celebrava os santos sacrifício do altar e mais divinos ofícios e o mais é que
servia de matriz, por ser a dita missão freguesia separada”. Devoto fervoroso
que era da Senhora Santana concebeu logo o projeto de edificar ali uma Igreja,
que servisse de matriz aquela missão, o que, vencendo mil obstáculos, levou a
efeito. Concluída a igreja encomendou ele no Rio de Janeiro uma linda imagem da
Senhora Santana “com cinco palmos de alto, com a menina ao lado esquerdo a na
mão direita uma custódia de prata doirada para nela se expor o Santíssimo
Sacramento”. Deixa o Dr. Jose Carlos Pereira o seu cargo de Juiz de Fora e, em
novembro de 1781, parte de Cuiabá sem que, até essa data, houvesse ali chegado
a imagem da Senhora Santana que encomendara. “Chegado que foi o nosso devoto
fundador, Dr. Jose Carlos Pereira, a freguesia de Araritaguaba, da comarca de
São Paulo (assim nos conta o cronista), onde fazem desembarque os que vão
destas minas pelos rios para os povoados, e achando ai à nova imagem de Santa
Anna do Sacramento, aquela que havia mandado vir do Rio de Janeiro para se
colocar na sua freguesia, não lhe sofreu o animo passar adiante sem ver a
imagem e fazer lhe uma festa solene. Assim o executou a no primeiro domingo que
se seguiu, posta a Santa no trono do altar mor da igreja matriz de
Araritaguaba, com o Santíssimo Sacramento exposto na custódia, que havia
mandado também vir, que tinha a Santa na mão direita, se lhe cantou missa
solene, com sermão que pregou o reverendo Francisco Pinto Guedes, natural
destas minas e vigário encomendado daquela freguesia”. Não estaria neste fato,
contado pelo cronista cuiabano, a origem da Ienda da imagem de Nossa Senhora Mãe
dos Homens, contada pelos antigos portofelicenses, visto como a imagem da
Senhora Santana ficara para o seu destino? Não teria havido confusão nestas
duas imagens, visto como ha muitos que vem grande semelhança entre a imagem de
Nossa Senhora Mãe dos Homens, que se venera na igreja matriz de Porto Feliz e a
da Senhora Santana da igreja matriz de Parnaíba? Foi, portanto, segundo cremos
e salvo melhor documentação em contrário, a edificação de uma grande igreja
dedicada a Nossa Senhora Mãe dos Homens que deu origem à mudança da padroeira
de Araritaguaba, de Nossa Senhora da Penha para Nossa Senhora Mãe dos Homens.
(*) F. Nardy Filho - O Estado de
São Paulo, 2 de novembro de 1945, pp 5-6.
As Monções
F. Nardy Filho
O dia da partida de uma monção era dia de festa em Araritaguaba. Desde o
clarear do dia era grande o movimento e a azafama no porto; as canoas e batelões,
onde tremulavam bandeiras multicores, recebiam .o carregamento que deveriam
conduzir: mantimentos para a jornada, outras gêneros e artigos que seriam
vendidos nas minas; era um contínuo vaivém de carregadores do povoado para o
horto conduzindo cargas para o embarque. Pilotos, proeiros e remadores em seus
postos, prontos para a viagem, esperam o chefe, oficiais, soldados e os mais
que seguirão na expedição.
Na pequena e pobre igreja matriz o vigário celebra a santa missa
implorando a proteção de Deus e da Senhora da Penha e Boa Viagem para os que
vão partir. Finda a missa descem todos ao porto, indo na frente o chefe da
expedição e o vigário. Chegando ao porto todos se ajoelham e, com as faces
voltadas para o rio, recitam a ladaínha de N . Senhora, finda a qual dá-se o
embarque. Feito o embarque, o vigário procede à benção da monção; os remadores,
erguendo os remos, os cruzam no ar; da terra e das canoas estrugem tiros de
arcabuzes, rufam os tambores, é o sinal da partida; seguros por mãos vigorosas
os remos ferem as águas, vozerio de gente que se despede, vozes que invocam as
bençãos do céu, e lá vão as canoas pondo-se em movimento, seguindo na frente a
canoa chefe. A alegria da partida, o desejo de irem a essas famosas minas lhes
fazem esquecer a distância a vencer, os sofrimentos e trabalhos que os esperam,
os rios que terão de transpor, a ferocidade cios índios que encontrarão pelo
caminho; nada, nada faz arrefecer o seu entusiasmo, e seguem em demanda do
sertão à procura das minas. Navegam durante o dia e ao cair da tarde fazem
terra, onde os cozinheiros preparam-lhes o jantar, que também lhes servirá de
almoço no dia seguinte.
Cerca de quinhentas e trinta léguas têm eles de percorrer rio dorso (das
águas até Cuiabá. Nas cachoeiras, as canoas descem seguras por cordas que as
desviam da impetuosidade das águas, enquanto as cargas são conduzidas pelas
margens nos ombros dos tripulantes. Nos baixios são as canoas que são
arrastadas, acontecendo, não raro, ser um ou mais dos tripulante que, de dentro
da água, puxarei as canoas arrastadas pela correnteza. Nos saltos, tais como o
Avanhandava, Itapura e outros, é feita a varação, sendo as canoas arrastadas
por terra.
Assim descem o Tietê, seguem pelo Paraná, chegam ao Pardo; ai o trabalho
é dobrado e dois meses gastam na difícil e laboriosa subida desse rio. Chegando
a Camapuã, se não havia correspondência de monções que permitisse aos viajantes
continuarem a viagem nas canoas elos que se dirigiam em sentido contrário,
cedendo-lhes em troco as suas, faziam a varação ou baldeação das canoas por
terra, o que era feito, de preferência, à noite, em grandes carros de duas ou
três rodas, puxados, aos primeiros tempos, por escravos e índios e mais tarde
por juntas de bois. Se o tempo era propicio para que aproveitassem os xarieis,
ai, não raro, os esperavam os ferozes paiaguás .
Baldeadas as canoas para o Coxim, vencidas as cachoeiras deste rio,
chegavam ao Taquari e daí por diante, a não ser o risco de algum ataque dos
índios, a viagem se tornava mais suave. Feliz a monção que em sua rodada por
essas quinhentas e trinta léguas só teve ele lutar com os obstáculos que os
rios lhes opunham e não foram assoladas pelas febres, nem atacadas pelos índios
das margens desses rios.
Juzarte, em seu “Diário de Navegação”, assim nos descreve essas viagens,
referindo-se a que ele fez a Iguatemi: “Durante a viagem se costuma cozinhar à
noite, o que se há de comer no outro dia. Navega-se comumente das oito da manhã
às cinco da tarde. Uma das maiores canoas se arma em guerra, e que serve de
Capitânia e ao mesmo tempo de Guia. Cada canoa leva uma distância de cinqüenta
braças uma da outra, procurando sempre manter a mesma linha, seguindo todas a
canoa guia”.
E ao entardecer, o Sol doira o cimo das árvores, cujas sombras,
refletindo nas águas do rio, se alongam até a margem oposta; Araritaguaba,
tranqüila, sem rumores, sem outras galas daquelas com que a pródiga natureza a
dotara, se prepara para o repouso da noite: pela sua única rua não se nota
movimento algum, faz tudo em um grande silêncio como se fosse um lugar deserto,
uma povoação abandonada.
Um tiro de arcabuz vem quebrar esse silêncio; logo outro e mais outro se
fazem ouvir, e, como por encanto, aquela povoação, que parecia deserta, se
anima, de todas as casas abrem-se as portas, seus moradores aparecerem e todos,
pressurosos, volvem suas vistas para o rio.
Lá ao longe, na curva do rio, se avista uma canoa que, a força de remos,
vem subindo o rio; logo outra, outra mais, enfim, dezenas de canoas e batelões
demandavam a povoação. É uma monção que volta do Cuiabá. Da frota continuam os
tiros que são agora respondidos por outros, com que os de terra saúdam a
expedição que chega.
Aflui o povo de Araritaguaba ao porto e em todos os semblantes se vê
estampada a ansiedade. Chega a monção ao porto, abicam as canoas à terra.
graças aos céus partem dos que chegam e por entre alegre e festiva saudação
desembarcam os viajantes. Tez tisnada pelo Sol, barba e cabelos crescidos,
vestes encardidas, são logo cercados pelos que os esperam. Todos querem saber
noticias dos seus que há muito andam pelas minas; para uns há notícias alegres
e alviçareiras, os seus estão bons, foram felizes e pretendem voltar na próxima
monção; para outros noticias tristes, dos seus de há muito não se sabe, talvez
hajam morrido ou andem por longe. Outros mais felizes, recebem em seus braços
entes queridos que há muito não viam, e esse aglomerado de povo se agita, aqui
em risos e alegria, ali em prantos e lamentos; e lá do alto da povoação o
pequeno sino da matriz, chama o povo à oração e todos, os que vieram e os que
foram esperá-los, se encaminham à igreja onde, aos pés da Virgem, uns vão
render graças pelo êxito da viagem e outros vão rezar pelos seus mortos. No dia
seguinte, Araritaguaba amanhece movimentada; logo pela manhã começa a descarga;
do porto, nas barrancas do rio, na rua, nas casas, grupos animados, uns
cantando, outros ouvindo a história desse fabuloso Cuiabá.
Araritaguaba, pobre e quieta, torna-se por alguns dias cheia de
movimento e rica, o ouro corre como dinheiro, e dos que chegam todos querem
ostentar mais riqueza.
Porém, nem todas as monções tinham esse alegre e festivo retorno;
muitas eram desbaratadas, destroçadas nas cachoeiras e então os remanescentes
dessas expedições tornavam a Araritaguaba e sua chegada ao porto causava dó e
tristeza, porque só tristeza e luto trazia às famílias dos que partiram; de
dezenas de canoas que partiram, poucas conseguiram tornar, sem mesmo atingir o
fim da viagens; outras se despedaçaram, seus tripulantes morreram afogados ou trucidados
pelos índios, ou, então, pereceram vítimas das febres e da fome. Partiram
alegres, cheios de esperanças, e tornam, bem menos da metade, em frangalhos,
doentes e famintos, sem terem tido a dita de pisarem nessas maravilhosas terras
do Cuiabá.
As mais antigas expedições que nos consta terem partido de Araritaguaba
ou porto de Pirapitingui, como também era chamado, foram: a de Clemente Alvares
e Cristóvão de Aguiar (1609) , a de Luiz de Céspedes (1628) , a de André
Fernandes (1629) , a de Pedro Fernandes (1648) , a de Francisco Xavier Pedroso
(1670) , a de André Ferraz Parreiras e Jerônimo Ferraz (1680) .
.A última monção particular de que há lembrança, segundo nos conta o
saudoso Dr. Cesário Mota Júnior (1), foi a de Fermino Ferreira, e à qual já nos
referimos numa destas nossas crônicas. As principais e mais importantes
expedições que partiram de Araritaguaba foram: a em que seguiu Rodrigo Cézar de
Menezes (1726), a que levou o ouvidor geral Dr. José Gonçalves Pereira e
formada de 100 canoas ( 1735 ) , a que levou o primeiro capitão-general de Mato
Grosso, Dom Antonio Rolim de Moura ( 1750 ). Porém, a nosso ver, as mais
importantes e numerosas expedições que partiram de Araritaguaba, foram as que
levaram por fim a fundação de Iguatemi e foram as de João Martins de Barros e
André Dias de Almeida ( 1766-1767 ).
( 1 ) Em “Porto Feliz e as Monções para Cuiabá”, publicado em quatro
partes na Gazeta de Piracicaba, de 21, 23, 28 e 30/12,/1883 e reproduzido no
Almanaque Literário de São Paulo para 1884, publicado por José Maria Lisboa,
ano VII, pp. 131-151 .
OBS- artigo publicado no Estado de São Paulo em 14/10/1945
Porto Feliz 1.920 (*)
(Inauguração do ramal de Boituva a Porto Feliz - Grandes manifestações ao governo findo - O monumento aos Bandeirantes - Herma offerecida ao dr. Candido Motta - outras notas)
Em Porto Feliz
realizam-se no dia 26 de abril ( 1.920 ) imponentes festejos para commemorar a
inauguração do ramal ferreo da Sorocabana entre Boituva e aquela cidade –
a lendaria “Araritaguaba” de onde
partiam para as suas arriscadas incursões
pelo sertão os intrépidos bandeirantes paulistas.
Além de
representantes do alto mundo official, muitos outros convidados daqui seguiram
em trem especial para assistir aos aludidos festejos.
Pudemos tomar nota
dos seguintes nomes : Dr. Altino Arantes, presidente do Estado e seu ajudante
de ordens, capitão Herculano de Carvalho; dr. Candido Motta, secretário da
Agricultura, e seu auxiliar do gabinete dr. Edmundo Jordão; dr. José de Goes
Artigas, inspector geral da E. F. Sorocabana; dr. Alfredo Braga, director do
Museu Paulista; dr. Luis Silveira, comissário geral do estado em Bruxellas; dr.
Escragnole Taunay, diretor do museu
Paulista; dr Luis Fructuoso Ferreira da Costa, da comissão Geographica do
Estado; dr. Hugo Ribeiro, coronel Valencio de Castro, Fernando Motta Mello,
Joaquim Ignacio de Oliveira, esculptor
Julio Starace, coronel Marcolino Barreto, deputado federal; J. Maximiano
Motta, Euclydio Lucheal, dr.Plínio Ayres, Sylvio Brand Corrêa, J. Pereira
Pinto, Armando Pereira Leite, Jayino de Aguiar, Carlos S. Lichienfels, Alberto
Martino, Annibal Machado, do “S. Paulo Ilustrado”: Reynaldo Cunte Boardi,
Ottoniel Motta, Edgard Penteado, Francisco Augusto Ferraz do Amaral, José
Emydio Ferraz do Amaral, Luiz Ferraz do Amaral, Ataliba de Campos Motta, A .
Barros Lobo, José Maurício de Oliveira Sobrinho, Euchario Mauricio de
Olliveira, d. Maria José de Oliveira, d. Cacilda Caçapava Oliveira, Adolpho
Brand Corrêa, Antonio Madureira, Antonio Emydio de Barros, monsenhor Manfredo
Leite, Eduardo Beruin, dr. Oscar da Motta Mello, senhoritas Ruth Motta Mello e
Candida do Amaral Motta; dr Leopoldo de Freitas, do “Diário Popular”; dr.
Orlando de Almeida Prado, Leopoldo Martins de Camargo, dr. Manoel de Rezende,
dr. Theophilo de Souza, da Directoria de Viação; Getulio de Paiva, pelo
“Correio Paulistano”.
As 9 horas e 20
minutos chegava o trem especial a Sorocaba, sendo o sr presidente do Estado e
mais membros do governo esperados por importantes elementos sociais e grande
multidão.
Ao sr. Presidente
do Estado e do mais excursionistas foram offerecidos, numa das dependencias da
estação, café, leite, chocolate, etc.
Multas das pessoas
que aguardavam em Sorocaba a chegada do especial incorporaram-se a comitiva
official.
Chegada em Boituva
Em Boituva, onde
uma grande multidão esperava o trem presidencial, juntaram-se á comitiva os
srs. deputados drs. Laurindo Minholo e Antonio Cardoso do Amaral; José Giorgi,
empreiteiro da construcção do ramal; coronel Ovidio Vieira, dr. Normão
Bernardes, Oscar Fernandes, José Candido Freire, Alfredo Baptista das Chagas
auxiliar da fiscalização do ramal do Porto Feliz; Miguel Helou e outras
pessoas.
Do lado oposto á
estação de Boituva parte o ramal para Porto Feliz. O local achava- se
vistosamente enfeitado com bandeiras, folhagens e numerosa multidão andando e
saudando os srs, membros do governo.
Após pequena
demora, o sufficiente para substituir por outra mais leve locomotiva que tinha
vindo desde S. Paulo – partiu para Porto Feliz, às 11 e meia, o trem inaugural,
debaixo de acclamações do povo.
Velha aspiração de Porto Feliz
Era velha a aspiração do povo de Porto Feliz de ver a sua
cidade ligada a Boituva pela estrada de ferro. Esse melhoramento importava na
conquista menos penosa de mercado para os productos de seu solo, além de
proporcionar o commercio e as industrias locaes maior facilidade nas suas
relações tanto com os municípios vizinhos, como com a propria capital.
Servida embora por
uma boa estrada de rodagem, com a extensão de 21 Kilometros, Porto Feliz não
perdeu jamais a esperança de ver um dia realisado o sonho que ha muitissimos
annos acalentado.
Vem de longe data a
historia dessa estrada. Em 1.836 a Assembléia Provincial approvava um projeto
de lei concedendo grande somma de favores á empresa que se organizasse para
construir uma via ferrea de Santos a Porto Feliz. Nesse tempo, havia o desejo
de terminando a estrada naquela cidade, aproveitar- se o Tietê, rio abaixo,
para a navegação.
Em 1.898, o então
deputado estadual dr. Candido Motta apresentou um projeto concedendo a
subvenção de 300 contos para a construcção do ramal de Boituva a Porto Feliz,
também essa tentativa não logrou successo.
Achando- se a
dirigir a pasta da Agricultura no acctual governo, o dr. Candido Motta
conseguiu o que tanto desejavam os portofelicenses: -autorização do governo
para mandar construir o decantado ramal. A 26 de maio do ano passado ( 1.919 )
foi solenemente batida a primeira acta do novo trecho da Sorocabana, sendo
confiada a sua construção ao conhecido e esforçado empreiteiro J.Giorgi, que
dias depois iniciava os serviços com o seu numeroso pessoal . No ramal de Porto
Feliz trabalharam em media 700 operários. Esse numero chegou a elevar- se a mil
homens, para os serviços de terra foram empregados 400 animais de carroça.
O novo ramal
atravessa uma zona de boas terras roxas e massapé. São culturas principais da
região: - o café, o arroz, a canna, o algodão, etc.
A construção durou
cerca de dez meses, devendo- se notar que foram feitas varias obras de arte
entre as quaes se encontram quatro pontes, sendo duas com dez metros de vão e
duas com cinco metros de vão, dois boeiros com 2m,50 de vão cada um 46 boeiros
entre 80 centimetros e um metro de vão; numerosas passagens superiores,
inferiores e americanas ( "mata- cavallo", como se diz no
interior"); cortes e aterros pequenos grandes, senão que 4 aterros
importaram num movimento de 25.000 metros cubicos de terra, mais ou menos, cada
um.
O terreno da região
atravessada pelo ramal foi devidamente classificada, com o seguinte resultados
: 30 por cento de terra, 70 por cento de rocha, grés pedras soltas e piçarra.
A inauguração do trecho
A inauguração do trecho foi feita com a passagem do trem
presidencial, tendo o sr. José Giorgi empregado todo o esforço para que tal
acontecido
prorompeu em novas palmas e vivas. A criançada das escolas
fez- lhes manifestação.
Restabelecido o
silencio usou da palavra o dr. Alfredo Bauer, que saudou os srs dr. Altino
Arantes e Candido Motta.
Deixando a estação
a comitiva seguiu a pé, por entre alas de crianças. Os srs presidente do Estado
e secretário da Agricultura foram, então no trajeto pela praça cobertos de
petalas de rosas.
Formou- se grande
cortejo no qual tomaram parte as quatro bandas de musicas- seguindo pela rua
Sorocaba.
Terminou brindando
a Camara e a população de Porto Feliz.
Aplausos
prolongados cobriram as ultimas palavras do sr. presidente do Estado.
Após o banquete os
srs dr. Atino Arantes, dr. Candido Motta e os membros da sua comitiva
assistiram a um solenne "Te Deum" celebrado na matriz em ação de
graças pelo grande melhoramento que acabava de ser inaugurado em Porto Feliz.
Nesta ocasião
subindo ao pulpito orou brilhantemente o monsenhor dr. Manfredo Leite.
Disse sua revma.
que esta mesma fé que outrora, qual pharol rutilante, guiava os passos dessa
phalange de grandes, de bravos e de heroes que empunhando uma cruz partiam de
Porto Feliz em demanda de outras terras afim de lhes levar a civilização o
progresso preside hoje a festa solenne e bella que se está realizando.
O sr dr. Manfredo
Leite, depois de demonstrar cabalmente que todos os pontos da nossa historia
estão iluminados pela fé terminou a sua bella oração sendo muito cumprimentado.
Inauguração da placa na estação
As 18 e meia horas, acompanhada de grande multidão e varias
bandas de musicas a comitiva presidencial dirigiu- se de regresso para a
estação.
Ali houve ainda uma
solenidade: a inauguração de uma placa de bronze comemorativa da abertura ao
trafego do ramal de Boituva.
São os seguintes os
dizeres dessa placa - "Ramal de Boituva a Porto Feliz"- iniciado em
26-4-1.919 e inaugurado em 26-4-1.920, sendo presidente do Estado o exmo sr dr.
Altino Arantes e secretario da Agricultura o exmo sr. dr. Candido Motta.
O dr. Leopoldo de
Freitas fez um discurso alusivo a acta.
As 18 e meia horas
partiu para São Paulo o comboio especial.
Da inauguração do ramal
ferreo de Boituva a Porto Feliz foi lavrada uma acta para ser colocada em local
já preparado na estação; assinaram os srs. presidente do estado, secretário da
Agricultura e outras pessoas com uma caneta de ouro oferecida a camara pelo sr
André Rocha.
O sr. José Giorgi,
contratante da construção do ramal ferreo de Boituva a Porto Feliz, ofereceu
aos srs dr. Altino Arantes e dr. Candido Motta dois lindos cartões de ouro com
estas incrições:
"Ao exmo sr. presidente do estado dr Altino Arantes -
Lembranças da Inauguraçao do ramal ferreo de Boituva a Porto Feliz, oferta que
fez o construtor José Giorgi, Porto Feliz, XXVI-IV-MCMXX".
"Ao exmo sr dr. Candido Motta D. D.Secretario do estado
do negocios da Agricultura, Comercio e Obras publicas - Lembranças da
Inauguração do ramal ferreo de Boituva a Porto Feliz, iniciado em XXVI de março
de MCMXIX oferece o construtor José Giorgi Porto Feliz... XXVI-IV-MCMXX".
Por ocasião da
inauguração em Porto Feliz dos importantes melhoramentos a que se refere a
nossa noticia, o orgam local, O Novo Porto, publicou uma edição especial.
Pedimos venia para
trancrever desse numero, os seguintes editoraes:
Ramal Ferreo
Mercê de Deus o aureo
sonho do povo de nossa terra transformou -se na mais feliz e ditosa realidade.
Não tardará o
momento em que as nossas almas hão de vibrar de entusiasmo e de delirio, bem
perto vem o comboio presidencial soberbo e triunfante a vencer distancia para
compartilhar das nossas justas alegrias.
A velha aspiração do povo de Porto Feliz é um
fato consumado - Se não fora, porém a bondade imensa do Dr. Altino Arantes
varão ilustre que com inexcidivel brilho e competencia dirige os destinos de
São Paulo, se não fora o dr. Candido Motta, preclaro estadista que dedica amor
intenso a terra que lhe serviu de berço talvez jamais ouvissemos o silvo agudo
da locomotiva veiculo precursor do progresso e da civilização.
Razões sobejas
temos nós, portofelicenses para nos sentirmos satisfeitos no dia de hoje. A
data 26 de Abril marca com carateres indeleveis uma frase de prosperidade nos
anaes da velha Araritaguaba- Porto Feliz já merece o nome que tem graças ao
amor, ou melhora á abnegação de um filho mui direto que soube resgatar a devida
gratidão contraria com a sua terra natal.
Quem dentre nós,
porto felicenses, não se sentirá feliz no dia de hoje?
Por ventura não
será este o dia de maior felicidade ao povo desta terra rica e fertil talhada
para ser grande e forte?
Incontestavelmente
agora somos felizes!
Permita Deus que a
aureola da felicidade circumba para sempre a fronte altiva desses dois vultos
eminentes que batalharam com ardor em pról da nossa vitoria. Não menos
incansavel mostrou - se o sr. Coronel Eugenio Motta, digno prefeito municipal
que enviou todos esforços possiveis para ver o nosso supremo ideal
completamente realizado.
O dr. Altino
Arantes, o dr Candido Motta e Coronel Eugenio Motta são credores da nossa
eterna gratidão.
Deus os abençoe!
Homenagem
Não cabe numa cronica
feita sem pretenções de caracter biographico ou historico, fallar dos eminentes
vultos filhos da velha Araritaguaba, cujos nomes passaram para as paginas da
nossa historia,constituindo uma gloria imperecivel para esta terra e um
patrimonio apreciavel e valioso para o nosso pais.
Entre esses nomes
gloriosos e venerados destaca- se o do dr. Candido Motta, que muito se
notabilizou por seu amor á terra onde viu a luz e pela extrema dedicação em
pról do seu progresso.
Longe estamos de
pretender estudar nele o agregio mestre de direito ou consciencioso estadista.
Disso hão de se encarregar outros mais talentosos e mais capazes para poderem
analisar com certo e justiça as capacidades multiformes deste homem possuidor
de formosa inteligencia maleavel aliada a um grande amor pelo trabalho e a um forte
senso pratico que o tornam um reputado jurista ouvido com respeito e atenção e
ao mesmo tempo, um sagas politico com qualidade de extraordinario administrador
que se preocupa em cumprir honesta e escrupulosamente seu dever servindo o seu
pais com dedicação e com aplausos de todos aqueles que reconhecem o esforço
dispendido e têm exata compreensão das imensas dificuldades de toda ordem que
surgem a cada instante ante quem pretende administrar com justiça e proveito
publico, procurando servir o interesse da coletividade e defende-lo da ambição
dos individuos.
Pretendemos ainda
que pallidamente, falar e seu amor a terra natal, de seus esforços para
auxilia-la no desenvolvimento de suas riquezas, de colloca-la no mesmo pé de
progresso dos outros municipios do Estado.
Posso agora morrer,
porque esta realizado o sonho mais dourado da minha vida. Assim disse ele no
memoravel dia de 26 de Março de 1.919, quando se procedia a inauguração do
inicio das obras do ramal ferreo que hoje se acha concluido.
Esta frase encerra
todos os anhelos da sua alma e contém um mixto de tranquilidade, felicidade e
intensissimo jubilo porquanto ela é como o epilogo dos ingentes esforços por
ele realisados em pról da terra dos bandeirantes.
Desde que
principiou a guindar-se as altas posições que conquistou, independente de
proteções e arranjos por seus unicos meritos, teve sempre em mira servir esta
terra, defendendo seus direitos e demonstrando aos poderes publicos que ela é
merecedora duma melhor sorte, não podendo continuar privada das comunicações
pela vida ferrea num exilio desolador que se prolonga por qual um seculo,
porquanto o primeiro projeto da estrada de ferro no estado de S. Paulo era
ligar Santos a Porto Feliz.
A herma, portanto
que hoje vai ser não podia deixar, hoje que ouve pela primeira vez o silvo do
comboio graças aos esforços do Dr. Candido Motta, de prestar uma homenagem
sincera a esse homem que nunca olvidou a sua terra natal, servindo a muitas
vezes a preço de sacrificios, sendo alvo por isso de criticas de despeitados de
invejosos e de nulidades.
Que homenagem podia
corresponder aos serviços prestados pelo Dr. Candido Motta á Porto Feliz?
Cremos que nenhuma a não ser gravar em letras de ouro
indeleveis em cada coração porto felicense, o nome deste conterraneo que muito
merece a nossa imorredoura gratidão!
Ele para nós é um
verdadeiro idolo que veneramos vendo nele o maior portofelicense entre os vivos
e os mortos.
A herma portanto,
que hoje vai ser erigida no jardim publico desta cidade não é mais senão uma
pálida e insignificante homenagem comparada com a veneração e a estima que
temos pelo grande portofelicense.
Mas mesmo assim,
ela não deixa de synthetisar toda a nossa gratidão e todo o nosso
reconhecimento porque a ideia de sua ereção partiu do povo da simplicidade do
seu coração e da sinceridade dos seus sentimentos!
Porto Feliz,
26-4-1920
Não podiamos terminar estas notas sem uma referencia
especial ao nome do sr coronel Eugenio Motta, digno e esforçado prefeito
municipal de Porto Feliz e prestigioso chefe politico local.
A sua excia. que é
um trabalhador infadigavel muito deve o progresso da historica cidade cuja
administração municipal é um exemplo de muito que pode o honesto esforço quando
aliado ao desejo energico de vencer.
Porto Feliz pode
ufunar-se de ter a testa do executivo municipal um moço de grande valor e
extraordinaria força de vontade..
(*) S. Paulo
Ilustrado – 1920 - Administração de ANIBAL MACHADO - Secretario Correa
de Mello
Pça Cel Esmédio e os casarões na decada de 60
Pça da Matriz, em 1952
Casarões da praça da Matriz..prédios hoje ocupados por banco do Brasil e banco Itaú
Detalhe da antiga igreja matriz, 1950
Pça Pedro de Toledo, em frente Posto Shel Batelão
Casarões na pça Matriz
Hotel Central , frente a entrada da gruta na rua Bandeirantes
Pça Cel Esmédio e inicio da rua Altino Arantes
Rua Bandeirantes no casarão hoje é a Telefonica
Rua Bandeirantes
Pça da Matriz, em 1952
Casarões da praça da Matriz..prédios hoje ocupados por banco do Brasil e banco Itaú
Detalhe da antiga igreja matriz, 1950
Pça Pedro de Toledo, em frente Posto Shel Batelão
Casarões na pça Matriz
Hotel Central , frente a entrada da gruta na rua Bandeirantes
Pça Cel Esmédio e inicio da rua Altino Arantes
Rua Bandeirantes no casarão hoje é a Telefonica
Rua Bandeirantes
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