terça-feira, 19 de abril de 2016

A PARTIDA DA MONÇÃO VI


Eil-as, as toscas naus de borda rastejante.
À flor das águas, naus de estreitos rios quietos;
Eil-as, prestes a abrir para o sertão distante,
Para assombros de glória, o seu vôo de insetos.

Apinhem-se na praia os velhos, derramando
De encarquilhadas mãos inúteis para mais
A bênção dos que já se sentem bruxuleando
Aos que lhes vão tornar os nomes imortais.

Mães, deixai que, sonhando, a vista embevecida
De vossos filhos pouse, e se ilumine, e aprenda
Nessa formosa folha em que o livro da vida
Tem estrofes de poema e proporções de lenda.
Noivas, com os corações envoltos na penumbra
Indecisa do amor que se orgulha e se doe,
Vinde trazer-lhes vosso olhar de que resumbra
Saudade pelo amante e enlevo pelo herói...

Ao largo, enfim! Clarins e buzinas atroam.
E as canoas, na luz da manhã cor de rosa,
Pairam por um momento em pleno rio; aproam
Para o sertão. E rompe a marcha vagarosa.

Nos barrancos, até rente d′agua investidos
De filhos a sorrir e de mães a chorar,
Lancem as frouxas mãos e os olhos comovidos
O derradeiro adeus e o derradeiro olhar...

©VICENTE DE CARVALHO
In Poemas e canções, 1928
Vicente Augusto de Carvalho foi um advogado, jornalista, político, abolicionista, fazendeiro, deputado, magistrado, poeta e contista brasileiro

Nenhum comentário:

Postar um comentário