sexta-feira, 13 de maio de 2016



Porto Feliz – 1819


Auguste de Saint-Hilaire

"É muito menos extensa do que Itu e não tão bem construída: sua localização, porém, é infinitamente mais aprazivel. Efetivamente, estende‑se por uma colina, a cujo sopé corre o Tiete. De vários pontos vê‑se este rio, que serpenteia por um profundo vale, tendo situadas em margens várias fazendas; mas ao longe vêm-se campanhas cobertas de matas e de pastagens. A colina sobre a qual a cidade foi construída eleva‑se quase a pique acima do Tietê; contudo, em espaço considerável, estende‑se muito suave, até a margem do rio; nesse ponto, denominado porto, efetua‑se os embarques pela via fluvial. O terreno em que foi edificada Porto Feliz é muito acidentado. As ruas da cidade não são calçadas, nem mesmo foram niveladas. As casas, baixas, pequenas, afastadas umas das outras, só tem, em geral, o rés do chão; ao passo que as de Itu são, em sua maioria, construídas de taipa, em Porto Feliz são todas construídas com ripas cruzadas (pau a pique) e terra tapando os interstícios, e isso porque na cidade e seus arredores não é encontrada a argila própria para fazer a taipa. Não há em Porto Feliz senão um edifício religioso, que é a igreja paroquial, sendo a única construção feita como as casas de Itu. Na época de minha viagem, essa igreja, consagrada a Nossa Senhora Mãe dos Homens, não estava ainda inteiramente terminada . Mede cerca de 58 passos de comprimento, a contar da capela‑mor até a porta de entrada; tem duas torres que servem de campanário, construídas, segundo o costume do país, dos dois lados da porta central de entrada.

O Tietê atualmente, só contribui para embelezamento de Porto Feliz; mas, com o correr dos tempos, dará a esta cidade a mais alta importância. Com efeito, além do Salto de Itu, torna‑se ele navegável um pouco abaixo da mesma, e em Porto Feliz terão início as gigantescas navegações a que já me referi noutro lugar, e que ferem de espanto a imaginação dos europeus, acostumados a seus rios mesquinhos... Já a maior parte das casas de Porto Feliz pertencem a agricultores, e nessa localidade só vi um pequeno número de lojas e vendas. Constitui a riqueza da região a cultura da cana-de-açucar. Os habitantes de Porto Feliz afirmam ser suas terras, que tem cor vermelha, muito mais adequadas a essa cultura do que as terras de Itu; acrescentam que com o auxílio de dez pretos podem produzir mil arrobas de açucar e mais até; enfim, que não é necessário, depois de arrancada a cana, deixar repousar o terreno por mais de dois a quatro anos. Mas, de outra parte, Porto Feliz está mais longe de Santos do que Itu, gastando‑se mais de oito dias para a viagem a Santos; na época de minha passagem por ali, época em que o milho era raro e extremamente caro, os arrieiros exigiam, para o transporte de uma arroba (14, 7 quilos) uma pataca e meia (3 frs.), importância que, convém não esquecer, tinha valor muito mais elevado do que atualmente,''

(Auguste de Saint‑Hilaire ‑ Viagem A Província de São Paulo ( São Paulo, Livraria Martins Editora ‑ Editora da Universidade de São Paulo, 1.972)

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